quarta-feira, março 28, 2012

“PERDEMOS A GRAÇA”


Não fui quem disse isso. Quem disse que perdemos a graça foi Thamia Tavares, nossa colega aqui na Mirante. Ela estava certa. Hoje em dia, o nosso cotidiano ficou igual a estes céus de março, aqui em São Luís: cinzentos e tristes.
Primeiro, todos sabem, foi Chico Anysio. O criador de personagens maravilhosos como Nazareno, Azambuja e Salomé lutou por vários meses contra graves problemas de saúde. Foi um bravo, foi um forte, filho do Norte, mas enfim Deus resolveu que o Céu precisava renovar seu elenco de magníficos comediantes.
            Ontem, foi a vez de Millôr Fernandes. Outro mestre na arte de fazer rir. Ninguém melhor do que ele para apontar o ridículo de um comportamento – seja de um determinado grupo social ou da sociedade por inteiro.
Meus amigos Reydner Carvalho, Flávia Lopes e agora Laércio Campos sem dúvida alguma não gostarão desse exemplo do pensamento de Millôr, mas não estou nem aí. Para ele, por exemplo, “quando um grupo de pessoas pernósticas e incompetentes, chamadas professores, ensina a um indivíduo sem gosto e vocação, uma série de noções tolas ou, no máximo, discutíveis, consegue formar, no fim de uma dezena de anos, essa coisa ao mesmo tempo ridícula e monstruosa que se chama um homem culto”.
Millôr nasceu e morreu no Rio de Janeiro. Na verdade, ele veio a este mundo como Milton Viola Fernandes. O “Millôr” saiu da caligrafia duvidosa, com a qual o prenome aparece registrado em seu registro de nascimento. No futuro, ele seria mais citado e louvado pelos seus escritos, mas o “Vão Gogo” dos primórdios se destacava pelas ilustrações. Em particular, prefiro os haicais (ou haikais, como queiram). Muito antes do advento do Twitter, ele já dominava a arte de dizer muito com muito menos.
“Viva o Brasil/ Onde o ano inteiro/ É primeiro de abril”.
“Esnobar/ É exigir café fervendo/ E deixar esfriar”.
“Goze./ Quem sabe essa/ é a última dose?”.
Com Chico Anysio perdemos alguém que surgia na televisão para nos fazer rir. Cair na gargalhada, mesmo depois do desabamento de um prédio que matou não sei quantos; do achado de cadáveres desovados por traficantes de entorpecentes; de malucos que invadem escolas e matam estudantes que não tem nada a ver com suas sociopatices psicóticas. Com Millôr, foi a embora uma parte do pensamento contemporâneo que sabia tornar mais suaves os problemas da arena política ou mesmo do nosso comportamento no que ele tem de mais sublime e mais grotesco. Ou mais inusitado, como nesta observação:
“Não é o lar o último recesso do homem civilizado, sua última fuga, o derradeiro recanto em que pode esconder suas mágoas e dores. Não é o lar o castelo do homem. O castelo do homem é seu banheiro. Num mundo atribulado, numa época convulsa, numa sociedade desgovernada, numa família dissolvida ou dissoluta só o banheiro é um recanto livre, só essa dependência da casa e do mundo dá ao homem um hausto de tranquilidade. É ali que ele sonha suas derradeiras filosofias e seus moribundos cálculos de paz e sossego. Outrora, em outras eras do mundo, havia jardins livres, particulares e públicos, onde o homem podia se entregar à sua meditação e à sua prece”.
Vai com Deus, Millôr. E fala lá em cima que aqui nós tentaremos recuperar a graça, mesmo nestes dias acinzentados do mais longo de todos os nossos marços.

EDMUNDO, O GIGANTE DA COLINA


As equipes deVasco da Gama e Barcelona do Equador que, no dia 26 de agosto de 1998, pisaram no gramado do Estádio Monumental Isidro Romero Carbo Guayaquil, eram os seguintes:
BARCELONA: Cevallos; Gómez, Noriega (Aires, a 1 min do do 2°), Montanero, Quiñónez e George; Carabali, Morales e De Avila; Asencio e Delgado. O técnico era Ruben Insúa. Figuravam no banco: Valencia, Montaño, Capurro, Yanes, Rosero e Riveras.
VASCO DA GAMA: Carlos Germano; Vágner, Odvan, Mauro Galvão e Felipe; Luizinho (Vítor, aos 43 min do 2° tempo), Nasa, Juninho e Pedrinho (Ramon, aos 29 min do 2° tempo); Donizete e Luizão (Alex, aos 37 do 2° tempo). O técnico era Antônio Lopes. O banco: 12-Márcio, 17-Nélson, 18-Válber e 21-Mauricinho.

Nesse dia, o Vasco conquistou sua primeira Libertadores da América. Venceu a primeira partida, em São Januário, por 2 x 0, e no segundo jogo bateu os equatorianos por 2 x 1.
Uma conquista sensacional, mas que não contou com a presença do homem que foi um dos principais responsáveis, no ano anterior, por ter garantido a participação vascaína no torneio continental.

Edmundo Alves de Souza Neto foi o melhor jogador do Campeonato Brasileiro de 1997 e o maestro do título nacional do Vasco, naquele ano. Que torcedor do Trem-Bala, que assistiu ao jogo naquela quarta-feira, esquece o drible que tirou de combate dois zagueiros do Flamengo e bateu cruzado para fazer o gol mais bonito de sua carreira?

Ele se envolveu em muitas confusões. Provocou a morte de uma jovem inocente em um acidente de trânsito. Envolveu-se em muitas brigas  no gramado e fora das quatro linhas. Um biógrafo, daqui a alguns anos, terá um prato cheio para relatar às gerações do amanhã tantas desventuras desse personagem, que hoje à noite, em São Januário, terá enfim a despedida que tanto fez por merecer - enquanto brilhou nos gramados, levando não só o Vasco, mas também o Palmeiras, a tamanhas conquistas.

Que a torcida nas arquibancadas de São Januário grite a plenos pulmões: "Ah, é Edmundo!!!".